A Polícia Militar apresentou a ocorrência e delegado do DEIC lavrou flagrante… ( Por ignorância jurí
As coisas, elas têm de ser feitas com correção.
Quero dizer: sou delegado de polícia. Policial civil, com efeito.
Nessa qualidade também, vou emitindo minhas opiniões. Aplaudo o que me parece digno de ser celebrado e critico aquilo que me parece passível de censura.
A pautar-me, minha cosmovisão, minha consciência e os dados da realidade apreciável.
Toda essa perífrase para dizer: li faz pouco uma matéria a versar sobre a soltura, em audiência de custódia, dos indivíduos detidos por ocasião dos atos contra o governo Temer. Na época da multimídia, além de lê-la, assisti a um vídeo alusivo aos mesmo fatos.
Os jovens irrompem porta afora do fórum da Barra Funda , com um grito represado: -“não tem arrego, não tem arrego” (?!?!?!).
Permitam-me evocar o saudoso Nelson Rodrigues: houvesse a passar por ali um gringo recém-chegado ao país, haveria de anotar em seu caderninho: -” no Brasil, jovens heróis não arregam”.
Ora, uma pessoa minimamente arguta percebe se tratar de pura mise-en-scène. Os inimigos do regime democrático estão se transformando em heróis. E, para tanto, estão contando com apoio desabrido das…polícias.
E por que, sob minha ótica, eles são inimigos da democracia?
Explico: para mim, o impedimento da mandatária antecessora deu-se sob a tônica dos códigos legais, maiormente a Carta Magna.
Isso, por si só, arreda a possibilidade de insurgência? Claro que não. É saudável até que ela se dê -posto que eu não veja razões para tanto. De qualquer modo, a exemplo das manifestações em favor do impedimento, imensuravelmente maiores, elas se devem fazer apropriadamente.
Nos lugares e dias adequados. Sem se tolher a liberdade de ir e vir dos demais cidadãos. Sem se depredar patrimônio público e/ou alheio, etc. E isso vem se dando fartamente.
Feito esse digresso, volto ao ponto, perguntando: por que a mim me parece que a polícia está a colaborar com os inimigos da democracia?
Porque a prisão reportada na matéria foi uma absoluta excrescência, dando azo a que um magistrado fizesse um comparativo com a ditadura militar e para que os “manifestantes” saíssem do fórum da Barra Funda a vociferar o desrespeitoso grito de guerra, esperados por um séquito a brandir cartazes de fora Temer.
Com o perdão do trocadilho risível, deu-se uma barafunda à porta do Barra Funda.
Todos os policiais sabemos agir sob a injunção dos governos de turno, em todas as esferas de governo. Mas os governos, além de arbitrários, podem ser burríssimos.
A se depreender da matéria, e todo o mais constante, não houve na espécie qualquer ator executório por parte dos detidos, se marcar, nem os irrelevantes atos preparatórios. De mais a mais, evocar a dicção do art. 288, do Código Penal, ou outro congênere, revelou-se, além de enorme temeridade, um tiro no pé.
Comprovar as peculiaridades exigidas pelo tipo, no estreito limite de um flagrante, é remotíssimo e não se coaduna com a boa técnica. A polícia militar apresentou a ocorrência e o delegado lavrou o flagrante.
Foi um erro. Um erro enorme. Uma precipitação que rendeu munição retórica aos inimigos da democracia. Não quero ser leviano, mas não duvido que alguém, obsedado e obtuso, do alto escalão, tenha ingerido pela feitura desse equívoco.
Daí, fica fácil para os “meninos” pagarem de heróis. É nessa hora que um delegado de polícia, ainda que receoso por eventuais desdobramentos pessoalmente ruins, deve evocar as leis, a boa doutrina e a jurisprudência. Na espécie, deixar de lavrar o flagrante poderia ser, e decerto seria, tão trabalhoso quando fazê-lo. Mas, penso eu, seria o mais correto.
Em tempo: não conheço o caso detidamente. Pautei-me exclusivamente nos elementos esposados pela matéria.
Por uma qualquer omissão, que me tenha levado a um juízo equivocado, desculpo-me antecipadamente. De qualquer sorte, o que vai alinhavado não se circunscreve a um caso em específico.
Autor: Dr. João
Delegado de Polícia
Postado por: Fernando Almeida